O Vitória vai comer bolo na casa de voinho
O Vozão representa uma rara oportunidade de educação informal de netinhas e netinhos distribuídas nas torcidas brasileiras. Enquanto outros grupos sociais reforçam projetos de poder, como mulheres, afros, gays e afins, e pessoas com deficiência, nossos velhinhos jogam dominó.
O Ceará Sporting conserta este erro metodológico e anarcofóbico, pois propõe o bom convívio com nossa última idade tão esquecida. O Vitória é mais idoso, nascido no século XIX, no entanto é o alvinegro quem desenha para si o distintivo do tempo. A inclinação para acolher quem viveu mais vem dos primeiros anos do clube, quando um de seus presidentes referia-se aos jogadores como “meus netinhos”.
A Babilônia utilitarista não curte idosos porque, para quem se deixa capturar pela mecânica de mercado, os jovens servem melhor para escravizados. É uma mentalidade tacanha: nem o porteiro se garante quando trabalha parado.
O ensino fundamental serve para passar para o ensino médio; o ensino médio serve para profissionalizar o jovem; a profissão serve para o jovem se manter; ao se manter, o jovem constitui família; a família serve para ajustar na sociedade; ajustar na sociedade serve para seguir leis e normas; seguir leis e normas serve… isso vai assim idiotizando até a cova: aí, a cova serve para… nada! Ou para dar lucro a funerária e cemitério…
O Ceará dá um “chega!” na mentirada do “útil” como conceito-chave pois a figura do vovô nos ensina a amar o aparentemente “inútil”, o velhinho querido, experiente e … “fútil” pois não depende de efeito para ser feliz, o vozão se basta!
Vamos ao time: o professor Barroca entrou na fogueira mas conquistou o tri do Nordeste, diante do Sport, na Ilha do Retiro, nos pênaltis.
Estrela luminosa, teve até lance com duas bolas na trave, o VAR bonzinho anulou a defesa do goleiro do Sport; Barroca mexeu no time, fez uma salada tática vitaminada e Richard, o “Ricardão” pegador, destacou-se como melhor netinho…
Um tricampeão começa por um grande goleiro, pois o Vozão pode dar a bença a “Ricardão”… Nossos atacantes precisam seguir aprendendo as lições da coluna passada. Tréllez fez certinho, parabéns, leu a coluna; e no primeiro gol, Léo Gomes também leu direitinho sobre como aproveitar a linha burra…
No Ceará, a chave do castelo está guardada com Luiz Otávio; de seus comandos depende o posicionamento da retaguarda. Precisa ter alguém com ele, formando um belo par. Contra o Sport, duelou com Love… em seus poucos vacilos, vamos aproveitar. Eles virão!
O ritmo do Vozão é o forró. Time buliçoso, gosta da umbigada, meio-campo vira sanfona, vai lá e vem cá, isso cansa… Portanto, cabe a general Condé (escrevi certo hoje) pensar um jeito de acompanhar o resfolego e adaptar rapidamente o Nego quando a variação virar xote, xaxado, baião, coco, maxixe (tem muita diferença…).
Contra Sport, Ponte e ABC, deu pra perceber o perigo das rápidas movimentações de Janderson, Eric, Guilherme e até Chay, emprestado pelo Botafogo. E atenção: muito cuidado porque as bolas aéreas parecem uns drones… cada um com o seu, alguém na sobra e presta atenção porque o vô parece bonzinho, mas também dá castigo. E Bora Nego, investir no improviso e comer este bolo na casa de voinho…
Paulo Leandro é jornalista e professor Doutor em Cultura e Sociedade.
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